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Conselho

Fernando Pessoa

Sudoeste, Cadernos de Almada Negreiros, novembro de 1935, pp. 5-6.

  • [5]

    CONSELHO

    Cérca de grandes muros quem te sonhas.
    Depois, onde é visível o jardim
    Através do portão de grade dada,
    Põe quantas flores são as mais risonhas,
    Para que te conheçam só assim.
    Onde ninguém o vir não ponhas nada.
    [6] Faze canteiros como os que outros têm,
    Onde os olhares possam entrever
    O teu jardim como lho vais mostrar.
    Mas onde és teu, e nunca o vê ninguém,
    Deixa as flores que vêm do chão crescer
    E deixa as ervas naturais medrar.
    Faze de ti um duplo sêr guardado;
    E que ninguém, que veja e fite, possa
    Saber mais que um jardim de quem tu és
    Um jardim ostensivo e reservado,
    Por trás do qual a flor nativa roça
    A erva tam pobre que nem tu a vês...

    FERNANDO PESSOA

  • [5]

    CONSELHO

    Cerca de grandes muros quem te sonhas.
    Depois, onde é visível o jardim
    Através do portão de grade dada,
    Põe quantas flores são as mais risonhas,
    Para que te conheçam só assim.
    Onde ninguém o vir não ponhas nada.
    [6] Faz canteiros como os que outros têm,
    Onde os olhares possam entrever
    O teu jardim como lho vais mostrar.
    Mas onde és teu, e nunca o vê ninguém,
    Deixa as flores que vêm do chão crescer
    E deixa as ervas naturais medrar.
    Faz de ti um duplo ser guardado;
    E que ninguém, que veja e fite, possa
    Saber mais que um jardim de quem tu és
    Um jardim ostensivo e reservado,
    Por trás do qual a flor nativa roça
    A erva tão pobre que nem tu a vês...

    FERNANDO PESSOA