Corpus version C2.1.0
Cartas a Bancos e Sociedades
Anónimas, quando se dirigem aos Bancos ou Sociedades
impessoalmente, empregam o tratamento de «V. S.ᵃˢ » e
abrem com «Il.ᵐᵒˢ Srs.» (nunca com «Amigos e Srs.»).
Quando, porêm, sejam dirigidas á Direcção ou Directores,
abrem com «Ex.ᵐᵒˢ Srs.», e o tratamento é de
«Ex.ᵃˢ».
Nenhuma carta deve estar sem
resposta mais de 5 dias, sendo nacional, ou 10 dias, sendo
estrangeira. Uma demora maior obriga legitimamente a
apresentar uma desculpa, em geral falsa, e que, ao
contrário do que em geral julgam os que pedem desculpa, é
quasi sempre tida por falsa, mesmo que seja verdadeira. Ou
a carta não tem resposta, e não se lhe responde; ou tem
resposta, e se lhe responde logo; ou não pode ter resposta
logo, e então escreve-se dizendo isso. A fama de ser
atencioso e cortês vale mais que uma estampilha. É uma
publicidade barata.
Nas cartas comerciais onde
seja essencial sêr-se muito preciso, é conveniente
evitar-se aquela precisão verbal excessiva que parece
juridica. Nenhum comerciante gosta de ter, ainda que
momentaneamente, a impressão de que é o advogado do
correspondente que lhe está escrevendo. A precisão
comercial deve ter sempre um ar casual e despreocupado ‒ o
da conversa dum homem inteligente.
No fecho das cartas onde se
dá tratamento de Excelencia nunca se emprega a palabra
«estima.» Ás Excelencias compete «consideração» ou
«respeito.» Estima é só para as Senhorias.
Escreve-se sempre em breves
palavras ‒ nas mais breves que seja possivel ‒ a uma casa
inglêsa, e desenvolvidamente a uma casa americana. Os
inglêses querem vêr tudo depressa; os americanos querem
vêr tudo.
A uma firma inglêsa, que não
seja individual, abre-se a carta com «Dear Sirs», e
fecha-se com «Yours faithfully.» A uma casa americana nas
mesmas condições, abre-se a carta com «Gentlemen», e
fecha-se com «Yours very truly.» No caso de firmas
individuais, a diferença de fecho permanece, mas a
abertura é a mesma ‒ «Dear Sir» ‒ para o inglês e para o
americano.
Uma carta áspera ou violenta
é sempre injustificada, porque é sempre inútil. Indispõe,
e não dá resultado. Quem não paga porque não quere, não
passa a pagar por lhe dizerem que não paga porque não
quere. Isso já êle sabe. E quem não paga porque não pode
não fica contente que se lhe diga ou se lhe insinúe que
não paga porque não quere.
Um comerciante nunca oficía.
Mesmo dirigindo-se ás instancias oficiais, não abdica da
fórmula comercial ‒ a que para o caso seja mais apropriada
‒ de abrir e fechar a carta.
É do pior gôsto, e do pior
efeito, desculpar-se um chefe com «um êrro dum empregado.»
Não há êrros de empregados. Todo o êrro dum empregado é
apenas o êrro de ter empregados que fazem êrros.
Uma carta em francês nunca
fecha com a inclusão da palavra «considération» quando
seja para iguais ou para superiores. «Considération» é só
para inferiores. O equivalente francês do emprego
português da palabra «consideração» é o emprego ou de
«salutations distinguées» ou de «sentiments distingués». O
ponto é digno de referir-se porque ha até muitos francêses
que o ignoram.
Uma firma, embora individual,
ganha sempre em falar no plural.
Evite-se sempre dar a uma
casa estrangeira referencias no nosso país ou na nossa
praça que não sejam bancarias. E mesmo as referencias
bancarias, convêm dá-las de um modo a que se póde chamar
translato. Faça-se com que o banco local que nos conhece,
e nos serve portanto de referencia, transmita ao seu
correspondente no país estrangeiro respectivo as
informações que póde dar a nosso respeito; cite-se depois
como referencia o banco por intermedio dêsse seu
correspondente. Deve sempre facilitar-se a consulta de
referencias, a não ser, é claro, que estas sejam falsas.
Isso, porêm, já não é comercio.
Uma carta visivelmente
circular ‒ sobretudo se fôr impressa ou copiografada ‒ é o
pior meio de propaganda ou de publicidade que se conhece.
Evite-se, em todo impresso de propaganda, a fórma de
carta. Faça-se um pequeno prospecto, um folheto diminuto;
empregue-se um postal sem fórma epistolar; mas não se faça
uma parecença de carta, porque uma carta implica atenção
ou consideração, e uma coisa impressa implica o contrario.
Uma consideração geral, uma consideração ás séries, não se
entende. Ha só um caso em que a circular impressa é
aceitavel: é cuando anuncía ou rèclama um livro, ou outra
qualquer publicação. A identidade de naturesa entre
objecto rèclamado e a fórma do rèclame esbate o
contra-efeito da circular.
Um anuncio difere dum cartaz
em que o cartaz deve chamar a atenção e prendê-la no mesmo
acto, isto é, de um só golpe, ao passo que o anuncio deve
chamar a atenção para depois prendê-la. Ha, pois, muitos anuncios que são simples
cartazes em miniatura. Só por qualquer circunstancia
particular ‒ estranha portanto á indole do anuncio ‒ póde
um anuncio deste género servir o fim a que se destina. E é
singular que os alemães, tão notavelmente especialistas
por indole e educação, tão constantemente empreguem o
anuncio-cartaz, isto é, o anuncio em que o interesse
reside no simples aspecto e disposição tipográfica. É o
unico lapso ‒ mas é um lapso grave ‒ da tecnica
publicitaria alemã.
O nosso tempo, em que tantas
actividades complexas se desenvolvem, criou profissões
novas, algumas estranhissimas. Mas entre elas ainda não
apareceu uma que é muito precisa ‒ a de professor de
leitura para as pessoas que já sabem lêr.
Esta observação não é um
disparate. Um grande numero de pessôas ‒ a maioria,
talvez, se vissemos bem ‒ são absolutamente desatentas:
nem vêem o que vêem, nem lêem o que estão lendo.
É extraordinario o numero de
negocios que se demoram, se complicam inutilmente, ou,
até, se enredam com gravidade, por o comerciante se não
dar ao trabalho de lêr o que lhe escrevem. Depois responde
concordando com o que não se lhe propoz, ou perguntando o
que já está dito.
Todo o homem de nogocios deve
lêr as cartas que recebe palavra a palavra e atentamente.
A correspondencia comercial deve ser lida em socego, e sem
interrupção, nem no meio de uma carta, nem mesmo entre
carta e carta, para que não se perca a continuidade da
atenção. Lida cada carta, deve fazer-se um rapido, e
instintivo, esboço mental do sentido do seu conteúdo. O
comerciante tem pressa? Lê depois, quando tiver vagar.
Nunca tem vagar? Se não tem vagar para trabalhar, o que é
que lhe tira o vagar?
Em correspondencia comercial
ha trez principios que convêm ter presentes: antes mais
explicado que mais breve; antes muitos paragrafos que
poucos; antes responder depressa, embora dizendo só parte,
que demorar a resposta para dizer tudo.
Muita gente fala de comercio
como se êle fôsse só um. Na realidade, não ha comercio: ha
comercios. No exercicio de um empregam-se qualidades
diferentes do que no exercicio de outro. Há, é certo,
principios e preceitos comuns a todos os generos de
comercio. Êsses, porêm, são abstratos e gerais, e
aplicam-se tambem a outras colectividades, não comerciais,
que implicam o serviço do público.
Nos paises de grande
desenvolvimento comercial, e onde, portanto, cada espécie
de comercio se especialisou definidamente, há diferenças
até de mentalidade entre os comerciantes de una espécie e
os comerciantes de outra espécie. O comercio comissionário
implica o uso de faculdades diversas daquélas que entram
em campo no comercio de conta propria. A mentalidade do
grande exportador (empregando «grande» no sentido de
competencia, e não propriamente de vulto das transacções)
difere da mentalidade do grande importador. A tecnica do
comercio interno aparta-se por vezes extraordinariamente
da do comercio externo.
Êste principio debe ter-se
presente, não só para fins de organisação, mas tambem para
fins de se tratar competentemente com os chefes de casas
comerciais de paizes que atingiram uma especialisação
mercantil definida.
Os homens dividem-se, na vida
prática, em trez categorias ‒ os que nasceram para mandar,
os que nasceram para obedecer, e os que nasceram nem para
uma coisa nem para outra. Estes ultimos julgam sempre que
nasceram para mandar; julgam-no mesmo mais frequentemente
que os que efectivamente nasceram para o mando.
O caracteristico principal do
homem que nasceu para mandar é que sabe mandar em si
mesmo. O caracteristico distintivo do homem que nasceu
para obedecer é que sabe mandar só nos outros, sabendo
obedecer tambem. O homem que não nasceu nem para uma coisa
nem para outra distingue-se por saber mandar nos outros
mas não saber obedecer.
O homem que nasceu para
mandar é o homem que impõe deveres a si mesmo. O homem que
nasceu para obedecer é incapaz de se impôr deveres, mas é
capaz de executar os deveres que lhe são impostos (seja
por superiores, seja por formulas sociais), e de
transmitir aos outros a sua obediencia; manda, não porque
mande, mas porque é um transmissor de obediencia. O homem
que não nasceu para mandar nem para obedecer sabe só
mandar, mas, como nem manda por indole nem por transmissão
de obediencia, só é obedecido por qualquer circunstancia
externa ‒ o cargo que exerce, a posição social que ocupa,
a fortuna que tem...
Chamamos para estas singelas
considerações psicológicas a atenção dos leitores.
Devidamente compreendidas, elas elucidar-lhes-hão muitas
coisas, e muita gente...
Há trez tipos de energia ‒ a
do trabalhador, a do homem activo e a do
organisador.
O trabalhador exerce
regularmente um mistér ou um cargo segundo as normas dêsse
mesmo cargo ou mistér. Corre numa calha indefinidamente e
com grande utilidade social.
O homem activo nunca tem
mistér proprio; a simples actividade é indisciplinada por
natureza. Exerce êle sempre um cargo ocasional e
temporario, uma especie de molde em que vasa um momento a
sua energia constante. Esse momento pode durar toda a
vida: esse molde pode nunca quebrar-se.
O organisador trabalha pouco:
faz só calhas e moldes.
A tendencia moderna para a
organisação e coordenação, quanto possivel perfeita, dos
serviços de escritorio, de modo a torná-los mais simples e
mais rapidos, deu em resultado a invenção, constantemente
crescente, de sistemas, processos, moveis e aparelhos
diversa e diferentemente conducentes a esse fim. Alguns
desses processos, desses moveis e dessas maquinas são
muito engenhosos; quasi todos são uteis ou aproveitaveis.
Mas o emprego deles, sejam quais forem, deve obedecer
sempre a um criterio superior. Um sistema não é uma
cabeça; um movel não é gente. Todos os processos e todos
os aparelhos resultarão elementos inuteis de organisação
se as cabeças dos individuos que os empregam não estiverem
organisadas tambem. E essas cabeças estarão organisadas se
estiver organisada devidamente a mesma parte do corpo do
chefe que os dirige. Assim como se podem escrever asneiras
com uma maquina de escrever do ultimo modelo, se podem
fazer disparates com os sistemas e aparelhos mais
perfeitos para ajudar a não fazê-los. Sistemas, processos,
moveis, maquinas, aparelhos são ‒ como todas as coisas
mecanicas e materiais ‒ elementos puramente auxiliares. O
verdadeiro processo é pensar; a maquina fundamental é a
inteligencia.
Na confecção da
correspondencia comercial ha dois criterios fundamentais e
opostos, entre os quais é difícil escolher o que deva
preferir-se. O primeiro criterio é o de “marcar
personalidade” na correspondencia e no seu estilo — isto
é, buscar imprimir um cunho distintivo e pessoal a todas
as cartas, de modo que em qualquer delas se reconheça, por
assim dizer, a mesma voz que nas outras. O segundo
criterio é o de adaptar o estilo e feição da carta ao
estilo e feição das cartas do correspondente. A nosso ver,
nenhum dos criterios é universalmente preferivel. Ha casos
em que um estaria errado, casos em que estaria errado o
oposto. O importante é chamar-se a atenção do comerciante
para a existencia dos dois critérios. Saber que eles
existem, e em que consistem, é o principal.
Estão cheias as livrarias de
todo o mundo de livros que ensinam a vencer. Muitos dêles conteem indicações
interessantes, por vezes aproveitaveis. Quasi todos se
reportam particularmente ao exito material, o que é
explicavel, pois é êsse o que supremamente interessa a
grande maioria dos homens.
A sciencia de vencer é,
contudo, facilima de expôr; em aplicá-la, ou não, é que
está o segredo do exito ou a explicação da falta
dêle.
Para vencer ‒ material ou
imaterialmente ‒ trez coisas definiveis são precisas:
saber trabalhar, aproveitar oportunidades, e criar
relações. O resto pertence ao elemento indefinivel, mas
real, a que, á falta de melhor nome, se chama
sorte.
Não é o trabalho, mas o
saber trabalhar, que é o segredo do exito no
trabalho. Saber trabalhar quere dizer: não fazer um
esforço inutil, persistir no esforço até o fim, e saber
reconstruir uma orientação quando se verificou que ela
era, ou se tornou, errada.
Aproveitar oportunidades quere dizer não só não as perder, mas tambem
achá-las.
Criar relações tem dois
sentidos ‒ um para a vida material, outro para a vida
mental. Na vida material a expressão tem o seu sentido
directo. Na vida mental significa criar cultura. A
historia não registra um grande triunfador material
isolado, nem um grande triunfador mental inculto. Da
simples «vontade» vivem só os pequenos comerciantes; da
simples «inspiração» vivem só os pequenos poetas. A lei é
uma para todos.
Cada homem, desde que sái da
nebulose da infância e da adolescência, é, em grande
parte, um producto do seu conceito de si mesmo. Pode
dizer-se, em exagero mais que verbal, que temos duas
espécies de pais: os nossos pais, propriamente ditos, a
quem devemos o ser físico e a base hereditária do nosso
temperamento; e, depois, o meio em que vivemos, e o
conceito que formamos de nós próprios ‒ mãe e pai, por
assim dizer, do nosso ser mental definitivo.
Se um homem criar o hábito de
se julgar inteligente, não obterá com isso, é certo, um
grau de inteligência que não tem; mas fará mais da
inteligência que tem do que se se julgar estupido. E isto,
que se dá num caso intelectual, mais marcantemente se dá
num caso moral, pois a plasticidade das nossas qualidades
morais é muito mais acentuada que a das faculdades da
nossa mente.
Ora, ordinariamente, o que é
verdade da psicologia individual ‒ abstraindo daqueles
fenómenos que são exclusivamente individuais ‒ é tambem
verdade da psicologia colectiva. Uma nação que
habitualmente pense mal de si mesma acabará por merecer o
conceito de si que ante-formou. Envenena-se
mentalmente.
O primeiro passo para uma
regeneração, económica ou outra, de Portugal é criamos um
estado de espírito de confiança ‒mais, de certeza‒ nessa
regeneração. Não se diga que «os factos» provam o
contrário. Os factos provam o que quere o raciocinador.
Nem, propriamente, existem factos, mas apenas impressões
nossas, a que damos, por conveniência, aquele nome. Mas,
haja ou não factos, o que é certo é que não existe
sciência social ‒ ou, pelo menos, não existe ainda. E,
como assim é, tanto podemos crêr que nos regeneraremos,
como crêr o contrário. Se temos, pois, a liberdade de
escolha, porque não escolher a atitude mental que nos é
mais favoravel, em vez daquela que nos é menos?
Uma das palavras que mais
maltratadas teem sido, no entendimento que ha delas, é a
palavra oportunidade. Julgam muitos que por oportunidade
se entente um presente ou favor do Destino, analogo a
oferecerem-nos o bilhete que ha de ter a sorte grande.
Algumas vezes assim é. Na realidade quotidiana, porém,
oportunidade não quere dizer isto, nem o aproveitar-se
déla significa o simplesmete aceitál-a. Oportunidade, para
o homem consciente e prático, é aquêle fenomeno exterior
que pode ser transformado em consequencias vantajosas por
meio de um isolamente nêle, pela inteligência, de certo
elemento ou elementos, e a coordenação, pela vontade, da
utilização dêsse ou dêsses. Tudo mais é herdar do tio
brasileiro ou não estao onde caíu a granada.
Cartas a Bancos e Sociedades
Anónimas, quando se dirigem aos Bancos ou Sociedades
impessoalmente, empregam o tratamento de «V. S.ᵃˢ » e
abrem com «Il.ᵐᵒˢ Srs.» (nunca com «Amigos e Srs.»).
Quando, porêm, sejam dirigidas á Direcção ou Directores,
abrem com «Ex.ᵐᵒˢ Srs.», e o tratamento é de
«Ex.ᵃˢ».
Nenhuma carta deve estar sem
resposta mais de 5 dias, sendo nacional, ou 10 dias, sendo
estrangeira. Uma demora maior obriga legitimamente a
apresentar uma desculpa, em geral falsa, e que, ao
contrário do que em geral julgam os que pedem desculpa, é
quasi sempre tida por falsa, mesmo que seja verdadeira. Ou
a carta não tem resposta, e não se lhe responde; ou tem
resposta, e se lhe responde logo; ou não pode ter resposta
logo, e então escreve-se dizendo isso. A fama de ser
atencioso e cortês vale mais que uma estampilha. É uma
publicidade barata.
Nas cartas comerciais onde
seja essencial sêr-se muito preciso, é conveniente
evitar-se aquela precisão verbal excessiva que parece
juridica. Nenhum comerciante gosta de ter, ainda que
momentaneamente, a impressão de que é o advogado do
correspondente que lhe está escrevendo. A precisão
comercial deve ter sempre um ar casual e despreocupado ‒ o
da conversa dum homem inteligente.
No fecho das cartas onde se
dá tratamento de Excelencia nunca se emprega a palabra
«estima.» Ás Excelencias compete «consideração» ou
«respeito.» Estima é só para as Senhorias.
Escreve-se sempre em breves
palavras ‒ nas mais breves que seja possivel ‒ a uma casa
inglêsa, e desenvolvidamente a uma casa americana. Os
inglêses querem vêr tudo depressa; os americanos querem
vêr tudo.
A uma firma inglêsa, que não
seja individual, abre-se a carta com «Dear Sirs», e
fecha-se com «Yours faithfully.» A uma casa americana nas
mesmas condições, abre-se a carta com «Gentlemen», e
fecha-se com «Yours very truly.» No caso de firmas
individuais, a diferença de fecho permanece, mas a
abertura é a mesma ‒ «Dear Sir» ‒ para o inglês e para o
americano.
Uma carta áspera ou violenta
é sempre injustificada, porque é sempre inútil. Indispõe,
e não dá resultado. Quem não paga porque não quere, não
passa a pagar por lhe dizerem que não paga porque não
quere. Isso já êle sabe. E quem não paga porque não pode
não fica contente que se lhe diga ou se lhe insinúe que
não paga porque não quere.
Um comerciante nunca oficía.
Mesmo dirigindo-se ás instancias oficiais, não abdica da
fórmula comercial ‒ a que para o caso seja mais apropriada
‒ de abrir e fechar a carta.
É do pior gôsto, e do pior
efeito, desculpar-se um chefe com «um êrro dum empregado.»
Não há êrros de empregados. Todo o êrro dum empregado é
apenas o êrro de ter empregados que fazem êrros.
Uma carta em francês nunca
fecha com a inclusão da palavra «considération» quando
seja para iguais ou para superiores. «Considération» é só
para inferiores. O equivalente francês do emprego
português da palabra «consideração» é o emprego ou de
«salutations distinguées» ou de «sentiments distingués». O
ponto é digno de referir-se porque ha até muitos francêses
que o ignoram.
Uma firma, embora individual,
ganha sempre em falar no plural.
Evite-se sempre dar a uma
casa estrangeira referencias no nosso país ou na nossa
praça que não sejam bancarias. E mesmo as referencias
bancarias, convêm dá-las de um modo a que se póde chamar
translato. Faça-se com que o banco local que nos conhece,
e nos serve portanto de referencia, transmita ao seu
correspondente no país estrangeiro respectivo as
informações que póde dar a nosso respeito; cite-se depois
como referencia o banco por intermedio dêsse seu
correspondente. Deve sempre facilitar-se a consulta de
referencias, a não ser, é claro, que estas sejam falsas.
Isso, porêm, já não é comercio.
Uma carta visivelmente
circular ‒ sobretudo se fôr impressa ou copiografada ‒ é o
pior meio de propaganda ou de publicidade que se conhece.
Evite-se, em todo impresso de propaganda, a fórma de
carta. Faça-se um pequeno prospecto, um folheto diminuto;
empregue-se um postal sem fórma epistolar; mas não se faça
uma parecença de carta, porque uma carta implica atenção
ou consideração, e uma coisa impressa implica o contrario.
Uma consideração geral, uma consideração ás séries, não se
entende. Ha só um caso em que a circular impressa é
aceitavel: é cuando anuncía ou rèclama um livro, ou outra
qualquer publicação. A identidade de naturesa entre
objecto rèclamado e a fórma do rèclame esbate o
contra-efeito da circular.
Um anuncio difere dum cartaz
em que o cartaz deve chamar a atenção e prendê-la no mesmo
acto, isto é, de um só golpe, ao passo que o anuncio deve
chamar a atenção para depois prendê-la. Ha, pois, muitos anuncios que são simples
cartazes em miniatura. Só por qualquer circunstancia
particular ‒ estranha portanto á indole do anuncio ‒ póde
um anuncio deste género servir o fim a que se destina. E é
singular que os alemães, tão notavelmente especialistas
por indole e educação, tão constantemente empreguem o
anuncio-cartaz, isto é, o anuncio em que o interesse
reside no simples aspecto e disposição tipográfica. É o
unico lapso ‒ mas é um lapso grave ‒ da tecnica
publicitaria alemã.
O nosso tempo, em que tantas
actividades complexas se desenvolvem, criou profissões
novas, algumas estranhissimas. Mas entre elas ainda não
apareceu uma que é muito precisa ‒ a de professor de
leitura para as pessoas que já sabem lêr.
Esta observação não é um
disparate. Um grande numero de pessôas ‒ a maioria,
talvez, se vissemos bem ‒ são absolutamente desatentas:
nem vêem o que vêem, nem lêem o que estão lendo.
É extraordinario o numero de
negocios que se demoram, se complicam inutilmente, ou,
até, se enredam com gravidade, por o comerciante se não
dar ao trabalho de lêr o que lhe escrevem. Depois responde
concordando com o que não se lhe propoz, ou perguntando o
que já está dito.
Todo o homem de nogocios deve
lêr as cartas que recebe palavra a palavra e atentamente.
A correspondencia comercial deve ser lida em socego, e sem
interrupção, nem no meio de uma carta, nem mesmo entre
carta e carta, para que não se perca a continuidade da
atenção. Lida cada carta, deve fazer-se um rapido, e
instintivo, esboço mental do sentido do seu conteúdo. O
comerciante tem pressa? Lê depois, quando tiver vagar.
Nunca tem vagar? Se não tem vagar para trabalhar, o que é
que lhe tira o vagar?
Em correspondência comercial
há três princípios que convém ter presentes: antes mais
explicado que mais breve; antes muitos parágrafos do que
poucos; antes responder depressa, embora dizendo só parte,
que demorar a resposta para dizer tudo.
Muita gente fala de comercio
como se êle fôsse só um. Na realidade, não ha comercio: ha
comercios. No exercicio de um empregam-se qualidades
diferentes do que no exercicio de outro. Há, é certo,
principios e preceitos comuns a todos os generos de
comercio. Êsses, porêm, são abstratos e gerais, e
aplicam-se tambem a outras colectividades, não comerciais,
que implicam o serviço do público.
Nos paises de grande
desenvolvimento comercial, e onde, portanto, cada espécie
de comercio se especialisou definidamente, há diferenças
até de mentalidade entre os comerciantes de una espécie e
os comerciantes de outra espécie. O comercio comissionário
implica o uso de faculdades diversas daquélas que entram
em campo no comercio de conta propria. A mentalidade do
grande exportador (empregando «grande» no sentido de
competencia, e não propriamente de vulto das transacções)
difere da mentalidade do grande importador. A tecnica do
comercio interno aparta-se por vezes extraordinariamente
da do comercio externo.
Êste principio debe ter-se
presente, não só para fins de organisação, mas tambem para
fins de se tratar competentemente com os chefes de casas
comerciais de paizes que atingiram uma especialisação
mercantil definida.
Os homens dividem-se, na vida
prática, em trez categorias ‒ os que nasceram para mandar,
os que nasceram para obedecer, e os que nasceram nem para
uma coisa nem para outra. Estes ultimos julgam sempre que
nasceram para mandar; julgam-no mesmo mais frequentemente
que os que efectivamente nasceram para o mando.
O caracteristico principal do
homem que nasceu para mandar é que sabe mandar em si
mesmo. O caracteristico distintivo do homem que nasceu
para obedecer é que sabe mandar só nos outros, sabendo
obedecer tambem. O homem que não nasceu nem para uma coisa
nem para outra distingue-se por saber mandar nos outros
mas não saber obedecer.
O homem que nasceu para
mandar é o homem que impõe deveres a si mesmo. O homem que
nasceu para obedecer é incapaz de se impôr deveres, mas é
capaz de executar os deveres que lhe são impostos (seja
por superiores, seja por formulas sociais), e de
transmitir aos outros a sua obediencia; manda, não porque
mande, mas porque é um transmissor de obediencia. O homem
que não nasceu para mandar nem para obedecer sabe só
mandar, mas, como nem manda por indole nem por transmissão
de obediencia, só é obedecido por qualquer circunstancia
externa ‒ o cargo que exerce, a posição social que ocupa,
a fortuna que tem...
Chamamos para estas singelas
considerações psicológicas a atenção dos leitores.
Devidamente compreendidas, elas elucidar-lhes-hão muitas
coisas, e muita gente...
Há trez tipos de energia ‒ a
do trabalhador, a do homem activo e a do
organisador.
O trabalhador exerce
regularmente um mistér ou um cargo segundo as normas dêsse
mesmo cargo ou mistér. Corre numa calha indefinidamente e
com grande utilidade social.
O homem activo nunca tem
mistér proprio; a simples actividade é indisciplinada por
natureza. Exerce êle sempre um cargo ocasional e
temporario, uma especie de molde em que vasa um momento a
sua energia constante. Esse momento pode durar toda a
vida: esse molde pode nunca quebrar-se.
O organisador trabalha pouco:
faz só calhas e moldes.
A tendencia moderna para a
organisação e coordenação, quanto possivel perfeita, dos
serviços de escritorio, de modo a torná-los mais simples e
mais rapidos, deu em resultado a invenção, constantemente
crescente, de sistemas, processos, moveis e aparelhos
diversa e diferentemente conducentes a esse fim. Alguns
desses processos, desses moveis e dessas maquinas são
muito engenhosos; quasi todos são uteis ou aproveitaveis.
Mas o emprego deles, sejam quais forem, deve obedecer
sempre a um criterio superior. Um sistema não é uma
cabeça; um movel não é gente. Todos os processos e todos
os aparelhos resultarão elementos inuteis de organisação
se as cabeças dos individuos que os empregam não estiverem
organisadas tambem. E essas cabeças estarão organisadas se
estiver organisada devidamente a mesma parte do corpo do
chefe que os dirige. Assim como se podem escrever asneiras
com uma maquina de escrever do ultimo modelo, se podem
fazer disparates com os sistemas e aparelhos mais
perfeitos para ajudar a não fazê-los. Sistemas, processos,
moveis, maquinas, aparelhos são ‒ como todas as coisas
mecanicas e materiais ‒ elementos puramente auxiliares. O
verdadeiro processo é pensar; a maquina fundamental é a
inteligencia.
Na confecção da
correspondência comercial há dois critérios fundamentais e
opostos, entre os quais é difícil escolher o que deva
preferir-se. O primeiro critério é o de “marcar
personalidade” na correspondência e no seu estilo — isto
é, buscar imprimir um cunho distintivo e pessoal a todas
as cartas, de modo que em qualquer delas se reconheça, por
assim dizer, a mesma voz que nas outras. O segundo
critério é o de adaptar o estilo e feição da carta ao
estilo e feição das cartas do correspondente. A nosso ver,
nenhum dos critérios é universalmente preferível. Há casos
em que um estaria errado, casos em que estaria errado o
oposto. O importante é chamar-se a atenção do comerciante
para a existência dos dois critérios. Saber que eles
existem, e em que consistem, é o principal.
Estão cheias as livrarias de
todo o mundo de livros que ensinam a vencer. Muitos dêles conteem indicações
interessantes, por vezes aproveitaveis. Quasi todos se
reportam particularmente ao exito material, o que é
explicavel, pois é êsse o que supremamente interessa a
grande maioria dos homens.
A sciencia de vencer é,
contudo, facilima de expôr; em aplicá-la, ou não, é que
está o segredo do exito ou a explicação da falta
dêle.
Para vencer ‒ material ou
imaterialmente ‒ trez coisas definiveis são precisas:
saber trabalhar, aproveitar oportunidades, e criar
relações. O resto pertence ao elemento indefinivel, mas
real, a que, á falta de melhor nome, se chama
sorte.
Não é o trabalho, mas o
saber trabalhar, que é o segredo do exito no
trabalho. Saber trabalhar quere dizer: não fazer um
esforço inutil, persistir no esforço até o fim, e saber
reconstruir uma orientação quando se verificou que ela
era, ou se tornou, errada.
Aproveitar oportunidades quere dizer não só não as perder, mas tambem
achá-las.
Criar relações tem dois
sentidos ‒ um para a vida material, outro para a vida
mental. Na vida material a expressão tem o seu sentido
directo. Na vida mental significa criar cultura. A
historia não registra um grande triunfador material
isolado, nem um grande triunfador mental inculto. Da
simples «vontade» vivem só os pequenos comerciantes; da
simples «inspiração» vivem só os pequenos poetas. A lei é
uma para todos.
Cada homem, desde que sái da
nebulose da infância e da adolescência, é, em grande
parte, um producto do seu conceito de si mesmo. Pode
dizer-se, em exagero mais que verbal, que temos duas
espécies de pais: os nossos pais, propriamente ditos, a
quem devemos o ser físico e a base hereditária do nosso
temperamento; e, depois, o meio em que vivemos, e o
conceito que formamos de nós próprios ‒ mãe e pai, por
assim dizer, do nosso ser mental definitivo.
Se um homem criar o hábito de
se julgar inteligente, não obterá com isso, é certo, um
grau de inteligência que não tem; mas fará mais da
inteligência que tem do que se se julgar estupido. E isto,
que se dá num caso intelectual, mais marcantemente se dá
num caso moral, pois a plasticidade das nossas qualidades
morais é muito mais acentuada que a das faculdades da
nossa mente.
Ora, ordinariamente, o que é
verdade da psicologia individual ‒ abstraindo daqueles
fenómenos que são exclusivamente individuais ‒ é tambem
verdade da psicologia colectiva. Uma nação que
habitualmente pense mal de si mesma acabará por merecer o
conceito de si que ante-formou. Envenena-se
mentalmente.
O primeiro passo para uma
regeneração, económica ou outra, de Portugal é criamos um
estado de espírito de confiança ‒mais, de certeza‒ nessa
regeneração. Não se diga que «os factos» provam o
contrário. Os factos provam o que quere o raciocinador.
Nem, propriamente, existem factos, mas apenas impressões
nossas, a que damos, por conveniência, aquele nome. Mas,
haja ou não factos, o que é certo é que não existe
sciência social ‒ ou, pelo menos, não existe ainda. E,
como assim é, tanto podemos crêr que nos regeneraremos,
como crêr o contrário. Se temos, pois, a liberdade de
escolha, porque não escolher a atitude mental que nos é
mais favoravel, em vez daquela que nos é menos?
Uma das palavras que mais
maltratadas têm sido, no entendimento que há delas, é a
palavra oportunidade. Julgam muitos que por oportunidade
se entente um presente ou favor do Destino, análogo a
oferecerem-nos o bilhete que ha de ter a sorte grande.
Algumas vezes assim é. Na realidade quotidiana, porém,
oportunidade não quere dizer isto, nem o aproveitar-se
déla significa o simplesmete aceitál-a. Oportunidade, para
o homem consciente e prático, é aquele fenomeno exterior
que pode ser transformado em consequencias vantajosas por
meio de um isolamente nele, pela inteligência, de certo
elemento ou elementos, e a coordenação, pela vontade, da
utilização desse ou desses. Tudo mais é herdar do tio
brasileiro ou não estao onde caíu a granada.