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Falência?

Fernando Pessoa

O Tempo , 13 de outubro de 1918, p. 1.

  • FALENCIA?

    Ha uma frase comum a todos os nossos monarquicos, quando procuram cristalisar numa sintese impressiva o resultado d’aquelas elucubrações sociologicas que dimanam da “experiencia constitucional” da velha guarda, da “cultura classica” dos integralistas, e da “disciplina scientifica” do nosso indispensavel Alfredo Pimenta. A frase é esta: “A Republica faliu”.

    Com ela, para eles, está dito tudo, formulada em “bonbon” a acusação completa. Quotidianamente a escrevem, ou a subentendem. Estão sempre prontos a empregal-a, ou a apoial-a. Essa frase é todo o monarquismo.

    A asserção, porém, é das cousas mais idiotas que cerebro humano pode segregar. A analise escrupulosa d’ela revelará que, quer no sentido que um espirito logico e ordenado naturalmente lhe attribue, quer no sentido que lhe atribue a especie de espirito peculiar dos nossos monarquicos, ela é uma idiotice completa, interessante apenas como fotografia da psique realista.

    Tal vae ser a analise que não fiquem duvidas quanto á frase, nem, corolariamente, quanto aos autores d’ela.

    *

    A frase “A Republica faliu” ou não tem sentido logico nenhum, ou quer dizer que a Republica falhou “totalmente” como regimen. A frase é categorica e extrema; só tem sentido para exprimir que a Republica falhou “por completo”.

    Dizer de um regimen politico que ele falhou “por completo”, ou significa que ele é “de todo” inadaptavel ao meio nacional a que se destina, ou que desse meio se desadaptou “de todo”. Ora, quando um organismo ou “por completo” se não adapta ao meio, ou “de todo” se desadapta dele, acontece a esse organismo uma coisa patente e nitida. Esse organismo “morre”. Desadaptação “total” implica morte. Dizer, portanto, que a Republica faliu, ou significa que ela é “de todo” inadaptavel ao nosso meio nacional, ou que “por completo” se desadaptou dele. No primeiro caso, o sentido da frase é que “nunca existiu a Republica Portuguesa”; no segundo caso, o sentido da frase é que a “Republica Portuguesa já acabou”. Qualquer das conclusões é uma asneira.

    Isto é, a frase “A Republica faliu”, ou não tem sentido, ou tem um sentido que não é nenhum. Isto é logico; o contrario é apenas monarquico.

    *

    Como, porém, a frase teve origem em cerebros nevoentos, onde a disciplina de pensar não fez mossa, nem a cultura scientifica deixou rastro, temos porventura, que a aceitar como comportando um sentido meramente aproximado, nada rigoroso. Quando a empregam, pretendem talvez os monarquicos dizer que a Republica “está falhando”, ou, em frases mais simples, que a Republica tem revelado uma absoluta incompetencia governativa. Menos que isso, por certo, não pode a frase significar. Pois seja isso. Admitamos-lhes a tese. E, admitindo-a, vejamos, nem sequer o que ela vale, mas apenas o que ela é. Tanto bastará.

    *

    De três coisas, uma: ou essa incompetencia governativa da Republica deriva de uma decadencia geral do paiz; ou deriva da Monarquia anterior, cujos vicios a Republica herdasse; ou é vicio peculiar do regimen republicano.

    Se essa incompetencia deriva de uma decadencia geral do paiz, se o que é insanavel é Portugal, não pode a Republica ser acusada de nada como Republica. Se a Republica Portugueza falhou, não é como Republica, é como portugueza. Quando muito, nesta hipotese, pode a Republica ser acusada de ter vindo agravar com a anarquia das ruas, que sempre sucede a uma revolução, a anarquia dos espiritos, que caracteriza a agonia de uma nacionalidade. Mas neste caso, e dentro desta hipótese, uma restauração monarquica apenas agravaria a anarquia agravada. O desgraçado, que se afunda sem auxilio em lodo movediço, quanto mais gestos faz mais depressa se afunda. Se a Republica, na presente hipotese, foi um gesto que nos afundou mais, a restauração monarquica seria ainda outro gesto, que nos afundaria mais ainda.

    Se essa incompetencia deriva de vicios herdados da monarquia anterior, a Republica é um bem, por ter acabado com essa monarquia, e será tanto melhor quanto mais dessa monarquia se afaste, no tempo e nos processos.

    Mas nem uma nem outra destas hipoteses — postas aqui apenas para boa ordem do raciocinio — é a que os monarquicos sequer admitem. Qualquer delas está fóra da linha duma argumentação monarquica, e vae contra essa argumentação. Nós, porém, o que estamos seguindo é a pista da argumentação que convém aos monarquicos. Vamos, pois, á ultima das trez hipóteses, que é aquela onde eles assinariam de cruz. Admitamos-lhes, de braços cruzados, não só a incompetencia governativa da nossa Republica, mas tambem que essa incompetencia governativa é vicio “peculiar” da Republica. Só essa pode ser a tese “monarquica”. Pois vejamos o que dá de si a tese monarquica.

    *

    De trez coisas, uma: essa incompetencia governativa da Republica, ou é devida aos homens da Republica, ou aos principios republicanos, ou apenas ao facto de a Republica estar ainda em principio. Não há quarta hipotese possivel. Examinemos estas, uma a uma.

    Se deriva dos homens da Republica, temos, então, que, por um misterio social, o partido republicano é a parte mais corrupta e mais vil da sociedade portugueza. Ora um partido hipoteticamente composto dos homens mais corruptos e vis de um paiz, é, “ex-hipotesi”, o partido menos capaz de uma ação forte, pratica, eficaz, organizada. Nesse caso, como é que esse partido de fracos teve a força de fazer cair a monarquia? Como puderam esses desorganisados fazer baquear um regimen antigo, apoiado em varios partidos? — Foi uma ação destructiva? Não importa. O que importa para o caso presente é que foi ação “organisada”, ação “triumfante”. Tanto basta para invalidar a hipotese.

    Suponhamos então que o mal vem, não dos homens da Republica, mas da Republica “como regimen”, isto é, dos “principios republicanos”. Nesse caso, ou vem da exata aplicação desses principios, ou da falsa aplicação deles; isto é, ou os principios fazem mal por serem maus e (bem ou mal) aplicados, ou por serem, apesar de bons, mal aplicados.

    Se os principios são maus, são maus por serem absurdos, ou por serem imoraes; ou porque corrompem o caracter. Se é porque corrompem o caracter, o partido que neles se apoia, e sempre se apoiou, é o partido politico distinctivamente corrupto de Portugal. Caímos na tése de que o suposto mal é devido aos homens, e não aos principios, da Republica; e essa tése já está refutada. — Se é porque esses principios envenenam a inteligencia, ou essa corrupção da inteligencia tem importancia porque atinge o caracter, ou de per si. Se é porque atinge o caracter, estamos outa vez na hipotese dos homens, e não dos principios, que já foi posta de parte. Se é um fenomeno intelectual, apenas intelectual, só podem ser maus esses principios porque briguem com os fundamentos eternos das sociedades, com a propria natureza da vida social. Nesse caso, ou se tenta pôr em pratica esses principios, ou não. Se não, o fenomeno é puramente abstracto, não chega á acção, e para todos os efeitos não existe. Se se tenta, ou se desiste, ou se persiste. Se se desiste, é como se os principios não existissem. Se se persiste, o regime acaba, porque se desadapta da sociedade. O caso de persistir é o de se caminhar governativamente para um radicalismo cada vez maior. É precisamente o contrario o caso da Republica Portugueza.

    Se os principios, porém, são bons, e apenas é má a sua aplicação, só póde ser má por causa dos homens que aplicam. Ora esses homens aplicam mal esses bons principios, ou por uma deficiencia que lhes é peculiar, ou por participarem de uma deficiencia geral. Se é por uma deficiencia que lhes é peculiar, temos outra vez a regeitada hipotese de o mal vir dos homens, não dos principios, republicanos. — Se a deficiencia é geral, ou é do paiz, ou é da monarquia anterior, cujos vicios governativos houvessem contaminado o paiz. Já as duas hipoteses — admissiveis, mas “não na linha do argumento monarquico” — foram examinadas, e, por nem favorecerem o argumento monarquico (que é o que estamos seguindo) nem estarem na linha dele, postas de parte.

    Por exclusão de partes, portanto: se o mal governativo é peculiar da Republica, ele provém apenas de a Republica estar ainda em principio. Ora essa conclusão é profundamente republicana; é, mesmo, a defeza que todo o republicano espontaneamente faz dos defeitos e hesitações da Republica.

    *

    Recapitulemos.

    Seguimos a linha do argumento monarquico. Para a seguirmos puzemos de parte — sem as examinarmos mais do que para ver se convinham ao argumento monarquico — as hipóteses de que o mal geral do paiz (argumento não-monarquico, porque, se o mal é do paiz, não é do regimen), e de que o mal dimane da herança dos vicios monarquicos (argumento menos monarquico ainda). Seguimos, pois, a rigor a linha do argumento monarquico. E onde viemos ter? Por exclusão de partes, a esta conclusão: Se existe incompetencia governativa da Republica Portugueza, se essa incompetencia é tida por peculiar da Republica Portugueza, ela é peculiar da Republica Portugueza apenas por estar ainda em principio.

    Seguimos a rigor o argumento monarquico; descobrimos que ou era uma asneira ou um argumento republicano.

    Tão rica de ensinamentos é ás vezes uma simples frase, quando a vasculha um raciocinador, e não um intoxicado da cultura classica dos outros ou da disciplina scientifica que não tem!

    Fernando Pessoa.

    Este texto foi recuperado em 2002 por Mário Matos Lemos, segundo conta Richard Zenith, que o integrou pela primeira vez no corpus de publicações em vida de Pessoa em 2006 (Pessoa 2017, p. 476). No dia anterior, o jornal publicou a seguinte nota explicativa: «Temos em nosso poder um belo artigo do nosso presado colaborador, sr. Fernando Pessoa, que, por causas alheias à nossa vontade, publicaremos amanhã».
  • FALÊNCIA?

    Há uma frase comum a todos os nossos monárquicos, quando procuram cristalizar numa síntese impressiva o resultado daquelas elucubrações sociológicas que dimanam da “experiência constitucional” da velha guarda, da “cultura clássica” dos integralistas, e da “disciplina científica” do nosso indispensável Alfredo Pimenta. A frase é esta: “A República faliu”.

    Com ela, para eles, está dito tudo, formulada em “bonbon” a acusação completa. Quotidianamente a escrevem, ou a subentendem. Estão sempre prontos a empregá-la, ou a apoiá-la. Essa frase é todo o monarquismo.

    A asserção, porém, é das coisas mais idiotas que cérebro humano pode segregar. A análise escrupulosa dela revelará que, quer no sentido que um espírito lógico e ordenado naturalmente lhe atribui, quer no sentido que lhe atribui a espécie de espírito peculiar dos nossos monárquicos, ela é uma idiotice completa, interessante apenas como fotografia da psique realista.

    Tal vai ser a análise que não fiquem dúvidas quanto à frase, nem, corolariamente, quanto aos autores dela.

    *

    A frase “A República faliu” ou não tem sentido lógico nenhum, ou quer dizer que a República falhou “totalmente” como regímen. A frase é categórica e extrema; só tem sentido para exprimir que a República falhou “por completo”.

    Dizer de um regímen político que ele falhou “por completo”, ou significa que ele é “de todo” inadaptável ao meio nacional a que se destina, ou que desse meio se desadaptou “de todo”. Ora, quando um organismo ou “por completo” se não adapta ao meio, ou “de todo” se desadapta dele, acontece a esse organismo uma coisa patente e nítida. Esse organismo “morre”. Desadaptação “total” implica morte. Dizer, portanto, que a República faliu, ou significa que ela é “de todo” inadaptável ao nosso meio nacional, ou que “por completo” se desadaptou dele. No primeiro caso, o sentido da frase é que “nunca existiu a República Portuguesa”; no segundo caso, o sentido da frase é que a “República Portuguesa já acabou”. Qualquer das conclusões é uma asneira.

    Isto é, a frase “A República faliu”, ou não tem sentido, ou tem um sentido que não é nenhum. Isto é lógico; o contrário é apenas monárquico.

    *

    Como, porém, a frase teve origem em cérebros nevoentos, onde a disciplina de pensar não fez mossa, nem a cultura científica deixou rasto, temos porventura, que a aceitar como comportando um sentido meramente aproximado, nada rigoroso. Quando a empregam, pretendem talvez os monárquicos dizer que a República “está falhando”, ou, em frases mais simples, que a República tem revelado uma absoluta incompetência governativa. Menos que isso, por certo, não pode a frase significar. Pois seja isso. Admitamos-lhes a tese. E, admitindo-a, vejamos, nem sequer o que ela vale, mas apenas o que ela é. Tanto bastará.

    *

    De três coisas, uma: ou essa incompetência governativa da República deriva de uma decadência geral do país; ou deriva da Monarquia anterior, cujos vícios a República herdasse; ou é vício peculiar do regímen republicano.

    Se essa incompetência deriva de uma decadência geral do país, se o que é insanável é Portugal, não pode a República ser acusada de nada como República. Se a República Portuguesa falhou, não é como República, é como portuguesa. Quando muito, nesta hipótese, pode a República ser acusada de ter vindo agravar com a anarquia das ruas, que sempre sucede a uma revolução, a anarquia dos espíritos, que caracteriza a agonia de uma nacionalidade. Mas neste caso, e dentro desta hipótese, uma restauração monárquica apenas agravaria a anarquia agravada. O desgraçado, que se afunda sem auxílio em lodo movediço, quanto mais gestos faz mais depressa se afunda. Se a República, na presente hipótese, foi um gesto que nos afundou mais, a restauração monárquica seria ainda outro gesto, que nos afundaria mais ainda.

    Se essa incompetência deriva de vícios herdados da monarquia anterior, a República é um bem, por ter acabado com essa monarquia, e será tanto melhor quanto mais dessa monarquia se afaste, no tempo e nos processos.

    Mas nem uma nem outra destas hipóteses — postas aqui apenas para boa ordem do raciocínio — é a que os monárquicos sequer admitem. Qualquer delas está fora da linha duma argumentação monárquica, e vai contra essa argumentação. Nós, porém, o que estamos seguindo é a pista da argumentação que convém aos monárquicos. Vamos, pois, à última das três hipóteses, que é aquela onde eles assinariam de cruz. Admitamos-lhes, de braços cruzados, não só a incompetência governativa da nossa República, mas também que essa incompetência governativa é vício “peculiar” da República. Só essa pode ser a tese “monárquica”. Pois vejamos o que dá de si a tese monárquica.

    *

    De três coisas, uma: essa incompetência governativa da República, ou é devida aos homens da República, ou aos princípios republicanos, ou apenas ao facto de a República estar ainda em princípio. Não há quarta hipótese possível. Examinemos estas, uma a uma.

    Se deriva dos homens da República, temos, então, que, por um mistério social, o partido republicano é a parte mais corrupta e mais vil da sociedade portuguesa. Ora um partido hipoteticamente composto dos homens mais corruptos e vis de um país, é, “ex-hipotesi”, o partido menos capaz de uma ação forte, prática, eficaz, organizada. Nesse caso, como é que esse partido de fracos teve a força de fazer cair a monarquia? Como puderam esses desorganizados fazer baquear um regímen antigo, apoiado em varios partidos? — Foi uma ação destrutiva? Não importa. O que importa para o caso presente é que foi ação “organizada”, ação “triunfante”. Tanto basta para invalidar a hipótese.

    Suponhamos então que o mal vem, não dos homens da República, mas da República “como regímen”, isto é, dos “princípios republicanos”. Nesse caso, ou vem da exata aplicação desses princípios, ou da falsa aplicação deles; isto é, ou os princípios fazem mal por serem maus e (bem ou mal) aplicados, ou por serem, apesar de bons, mal aplicados.

    Se os princípios são maus, são maus por serem absurdos, ou por serem imorais; ou porque corrompem o caráter. Se é porque corrompem o caráter, o partido que neles se apoia, e sempre se apoiou, é o partido político distintivamente corrupto de Portugal. Caímos na tese de que o suposto mal é devido aos homens, e não aos princípios, da República; e essa tese já está refutada. — Se é porque esses princípios envenenam a inteligência, ou essa corrupção da inteligência tem importância porque atinge o carácter, ou de per si. Se é porque atinge o caráter, estamos outa vez na hipótese dos homens, e não dos princípios, que já foi posta de parte. Se é um fenómeno intelectual, apenas intelectual, só podem ser maus esses princípios porque briguem com os fundamentos eternos das sociedades, com a própria natureza da vida social. Nesse caso, ou se tenta pôr em prática esses princípios, ou não. Se não, o fenómeno é puramente abstrato, não chega à ação, e para todos os efeitos não existe. Se se tenta, ou se desiste, ou se persiste. Se se desiste, é como se os princípios não existissem. Se se persiste, o regime acaba, porque se desadapta da sociedade. O caso de persistir é o de se caminhar governativamente para um radicalismo cada vez maior. É precisamente o contrário o caso da República Portuguesa.

    Se os principios, porém, são bons, e apenas é má a sua aplicação, só pode ser má por causa dos homens que aplicam. Ora esses homens aplicam mal esses bons princípios, ou por uma deficiência que lhes é peculiar, ou por participarem de uma deficiência geral. Se é por uma deficiência que lhes é peculiar, temos outra vez a rejeitada hipótese de o mal vir dos homens, não dos princípios, republicanos. — Se a deficiência é geral, ou é do país, ou é da monarquia anterior, cujos vícios governativos houvessem contaminado o país. Já as duas hipóteses — admissíveis, mas “não na linha do argumento monárquico” — foram examinadas, e, por nem favorecerem o argumento monárquico (que é o que estamos seguindo) nem estarem na linha dele, postas de parte.

    Por exclusão de partes, portanto: se o mal governativo é peculiar da República, ele provém apenas de a República estar ainda em princípio. Ora essa conclusão é profundamente republicana; é, mesmo, a defesa que todo o republicano espontaneamente faz dos defeitos e hesitações da República.

    *

    Recapitulemos.

    Seguimos a linha do argumento monárquico. Para a seguirmos pusemos de parte — sem as examinarmos mais do que para ver se convinham ao argumento monárquico — as hipóteses de que o mal geral do país (argumento não-monárquico, porque, se o mal é do país, não é do regímen), e de que o mal dimane da herança dos vícios monárquicos (argumento menos monárquico ainda). Seguimos, pois, a rigor a linha do argumento monárquico. E onde viemos ter? Por exclusão de partes, a esta conclusão: Se existe incompetência governativa da República Portuguesa, se essa incompetência é tida por peculiar da República Portuguesa, ela é peculiar da República Portuguesa apenas por estar ainda em princípio.

    Seguimos a rigor o argumento monárquico; descobrimos que ou era uma asneira ou um argumento republicano.

    Tão rica de ensinamentos é às vezes uma simples frase, quando a vasculha um raciocinador, e não um intoxicado da cultura clássica dos outros ou da disciplina científica que não tem!

    Fernando Pessoa.

    Este texto foi recuperado em 2002 por Mário Matos Lemos, segundo conta Richard Zenith, que o integrou pela primeira vez no corpus de publicações em vida de Pessoa em 2006 (Pessoa 2017, p. 476). No dia anterior, o jornal publicou a seguinte nota explicativa: «Temos em nosso poder um belo artigo do nosso presado colaborador, sr. Fernando Pessoa, que, por causas alheias à nossa vontade, publicaremos amanhã».
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